sábado, 3 de dezembro de 2011

A importância do silêncio na liturgia


Dom Nelson Francelino Ferreira
Bispo Auxiliar da Arquidiocese do Rio de Janeiro
03/12/2011
“O silêncio do infinito me aterroriza”, dizia Pascal, mas nós podemos dizer que o silêncio de Deus nos edifica e nos encanta, pois é no silêncio que Deus nos fala e se nos revela (Cf. 1Rs 19,11-13). O silêncio é, pois, liturgia, e não mera ausência de sons ou de vozes.

Romano Guardini dizia que o silêncio é a condição primordial para toda ação sagrada e, se fosse interrogado, diria que é com o aprendizado do silêncio que se deve começar a vida litúrgica. De fato sabemos que o silêncio favorece a meditação, mergulha-nos no mistério de Deus e de nós mesmos, como também favorece em nós a contemplação dos bens eternos.

A realidade, porém, de muitas de nossas celebrações pode ser um desafio para a aprendizagem do silêncio, pois estas passaram de um acontecimento até então silencioso e equilibrado para uma celebração exageradamente sonora, cheia de palavras e músicas, com sons às vezes estridentes, ruidosos mesmo, em detrimento da mensagem do canto e, o que é pior, abafando a voz da assembleia celebrante, sem ainda levarem em conta que muitos dos que vêm celebrar já foram “bombardeados” pelo vozerio atordoante do mundo em que vivemos.

A reforma litúrgica do Concílio Vaticano II (Cf. SC nº 30) redescobriu a importância do silêncio litúrgico, retomando assim os valores de uma venerável tradição da Igreja, inspirada na revelação bíblica. Assim, o silêncio não pode mais ser descuidado, e até sacrificado, em nome de uma suposta participação ativa que se quer expressar apenas com vozes e gestos.

O episcopado francês, falando das exigências mal-orientadas e reguladas de participação ativa, “as quais não deixam mais espaço a um só momento de silêncio”, convida também a “observar a diferença profunda entre o silêncio de inércia das assembleias individualistas e informais, que precisa desaparecer, e o silêncio comunitário, alimentado e preparado pelo canto e pela catequese. O silêncio é o ápice da oração; é pela sua qualidade que se mede o esforço de participação”.

Analisando o texto dos diversos documentos da Igreja e de autores consagrados, percebe-se a qualificação do silêncio como “parte da celebração”, uma descoberta então feliz, que precisa ser entendida e aceita por todos, afastando aquele conceito às vezes negativo em que se vê o silêncio como momento estéril, de não participação ou de inércia.

Assim, em chave pedagógica, o silêncio é indicado como um dos elementos da liturgia a estar sempre presente na formação litúrgica de toda a Igreja. De acordo, pois, com a Instrução do Missal (IGMR nº 45), a natureza do silêncio depende do momento em que ele tem lugar na celebração, havendo sempre uma motivação mais geral que é a de promover a participação ativa dos fiéis (SC 30), levando-os a uma disposição viva para celebrarem os divinos mistérios, inserindo assim a assembleia no mistério que se celebra, pois o silêncio, favorecendo a escuta da Palavra de Deus, favorece também a sua acolhida e a resposta da meditação (IGMR nº 56).

Como dizia Dionísio, o Areopagita, capaz de criar o clima e as atitudes espirituais necessárias à experiência litúrgica e de oferecer às pessoas, comprometidas com a ação comunitária, um espaço vital para a sua inserção na ação celebrativa, com presença de viva interiorização, pois o silêncio “abre a fonte interior de onde brota a Palavra”, e seu cultivo na liturgia é sinal de maior maturidade celebrativa, silêncio, pois, que não é mutismo espiritual, mas momento vivificante da graça, na ação do Espírito.

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