sábado, 21 de maio de 2011

A Igreja e a proteção de menores






21/05/2011
Dom Pedro Cunha Cruz - Bispo Auxiliar do Rio de Janeiro

No último dia 16 de maio do corrente, foi publicada e divulgada, pela Congregação para a Doutrina da Fé, a “Carta circular para ajudar as Conferências Episcopais na preparação de linhas diretrizes no tratamento dos casos de abuso sexual contra menores por parte de clérigos”. Cabe ainda relembrar que estas não são as primeiras orientações da Igreja sobre os aspectos jurídicos, canônicos e civis sobre delitos sexuais com menores. Em 2001, o Papa João Paulo II, com Motu Próprio “Sacramentorum sanctitatis tutela”, colocou tais crimes entre os “delitos mais graves”, reservados à Congregação para a Doutrina da Fé e promulgou “normas processuais especiais”, para conhecer, julgar e punir esses crimes. E em 21 de maio de 2010, o Papa Bento XVI, com a intenção de melhorar a aplicação da lei, introduziu algumas mudanças e acréscimos importantes a essas normas, tornando-as mais exigentes e mais efetivas na averiguação e punição desses delitos.

O rigor e a rapidez com que a Santa Sé, nos últimos anos, por declarações, leis e medidas práticas, vem cobrando dos pastores a aplicação de tais normas, expressam o aspecto positivo deste documento, que revela a decisão da Igreja de não coadunar com clérigos maculados com tais delitos. Por isso, a referida carta sublinha o dever e a responsabilidade dos bispos diocesanos em assegurar o bem comum dos fiéis e, especialmente, crianças e jovens, assim como a necessidade de dar uma resposta adequada aos eventuais casos de abuso sexual contra menores, cometidos por clérigos em suas dioceses. A supracitada carta não negligencia a assistência às vítimas de tais abusos, dando-lhes uma devida proteção. Estão explícitas na Carta não só a aplicação do Direito Canônico, como também as disposições das leis civis, o que, positivamente, faz aumentar a consciência da gravidade do mal que possa ser cometido e a urgência da pena.

Cabe aqui ressaltar os cinco aspectos gerais que envolvem tal abuso, a saber: as vítimas do abuso sexual, a proteção dos menores, a formação dos futuros sacerdotes e religiosos, o acompanhamento dos sacerdotes e a cooperação com as autoridades civis. O aspecto relevante aqui está no fato de se dar crédito às palavras das vítimas e aos seus familiares, exigindo que estes sejam ouvidos pelo bispo ou um delegado. A propósito desta exigência, o Santo Padre Bento XVI dá um belíssimo exemplo ao querer se encontrar e ouvir as vítimas de abuso sexual em suas viagens apostólicas.

O saudoso beato João Paulo II, em seu discurso aos cardeais americanos, no dia 23 de abril de 2002, disse: “No sacerdócio e na vida religiosa não existe lugar para quem poderia fazer mal aos jovens”. Estas palavras chamam atenção sobre a responsabilidade específica dos bispos e superiores, dos futuros sacerdotes e religiosos. Daí a “Pastores dabo vobis” ter cobrado um correto discernimento vocacional e uma autêntica e integral formação humana e espiritualidade sadia dos candidatos ao sacerdócio. Não descartando, porém, uma especial formação permanente do clero, em especial nos primeiros anos da vida sacerdotal, valorizando sempre a fraternidade sacerdotal, pois o presbítero é chamado a uma relação fraterna com os demais; e o bispo a de um pai e irmão para ele.

O abuso sexual de menores, segundo a Carta, não está só voltado para o clero, mas pode envolver também pessoas religiosas ou leigos que trabalham nas estruturas eclesiásticas. Daí a cobrança de conduzi-los às autoridades civis competentes, cooperando assim com as mesmas. Tais penas devem ser aplicadas de acordo com a legislação de cada país.

A Carta resgata ainda a dignidade da pessoa humana, que não deve ser ferida, mas profundamente preservada, pois cada homem é um sacrário inviolável de seu Criador. Não faltam, portanto, indicações e orientações aos bispos e superiores maiores no modo de proceder nestes casos abusivos. Estes devem se empenhar ao máximo para prestarem às vítimas assistência espiritual e psicológica. Este é o primeiro caminho para que as vítimas possam encontrar assistência e reconciliação.

Para cumprir essas metas, é necessário, pois, como Igreja, assumir de forma responsável e oportuna, uma política de fundo que se concretize em ações que visam salvaguardar, de fato e de direito, os menores de nossas comunidades e da sociedade como um todo. Talvez assim, possamos resgatar as palavras de Jesus em seu ministério terreno, e que devem refletir na vida de cada ministro sagrado e de toda sociedade: “Deixai vir a mim as criancinhas” (Mt 19, 14).
Dom Pedro Cunha Cruz
Bispo Auxiliar do Rio de Janeiro

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